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Amiens, França |
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Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs
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A técnica é definida pela Escolástica, da mesma forma que as artes, como “recta ratio factibilium”.
Quer dizer, a reta ordenação do trabalho, ou também, a ciência de trabalhar bem.
Hoje, o mal uso da técnica, a empurra para produzir para além do que é bom, e espalhar instrumentos que afligem a vida dos homens.
Nos tempos em que o espírito do Evangelho penetrava todas as instituições, a técnica produziu frutos que vão além do tudo o que a Humanidade conheceu previamente.
Um desses frutos inigualados foi ‒ e continuam sendo ‒ as catedrais medievais.
Até hoje especialistas tentam decifrar como fizeram os arquitetos da Idade Média para, com tão pobres instrumentos, criar obras colossais que “humilham” as técnicas modernas mais avançadas.
Os técnicos das mais variegadas especialidades da construção e também da física, da química e das matemáticas se debruçam para tentar descobrir como os medievais erigiram esses portentos arquitetônicos.
Mergulham eles nos “mistérios das catedrais”.
São muitos os que até agora não estão elucidados: desde as fórmulas químicas desaparecidas que dão aos vitrais tonalidades únicas e irreproduzíveis até os mais complexos cálculos matemáticos e astronômicos que orientaram as proporções cósmicas das Bíblias de pedra.
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Beauvais, França |
Como decifrar o enigma?
“As catedrais se burlam de nós há oito séculos.
“Elas resistiram não só às intempéries e aos ataques insidiosos do clima, mas mais ainda por vezes a provas tão violentas como os bombardeios.
“Como é que estas catedrais loucas aguentam em pé?”, pergunta o arquiteto, historiador e geógrafo Roland Bechmann em seu livro “As raízes das catedrais”.
O livro de Bechmann recebeu elogios das maiores autoridades acadêmicas da França.
Ele tem o mérito de mexer numa polêmica silenciosa, mas aberta como uma chaga nas almas de inúmeros franceses.
Enquanto o mundo parece rumar para uma modernidade cada vez mais caótica, as catedrais góticas em seu mutismo eloquente apontam um caminho inteiramente diverso.
O comentarista Paul François Paoli, do jornal “Le Figaro”, resume esse conflito interior dos franceses:
“As catedrais góticas são as pirâmides do Ocidente e nós não acabamos ainda de compreender como é que elas puderam ser construídas numa época considerada obscura e arcaica do ponto de vista científico”.
O historiador Jacques Le Goff saudou o livro de Bechmann como uma obra prima de interdisciplinaridade sobre “esses prodígios de pedra que continuamos admirando em Amiens, Chartres ou Paris”.
Mas, segundo Bechmann, esses prodígios dizem uma coisa aos homens do século XXI: “como vocês são pequenos!”
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Chartres, França |
“No fim da época gótica ‒ explica o autor ‒ havia uma igreja para cada 200 habitantes da França, e esses prédios considerados em seu conjunto podiam abrigar uma população maior que a do país inteiro.
“Calcula-se que em trezentos anos a França extraiu, transportou de charrete e erigiu mais pedra que o antigo Egito em toda sua história”.
Mas não é só uma questão de tamanho e volumes, não, diz Bechmann.
É uma questão de ciência e grandeza de alma. E explica:
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Canterbury pela noite |
“Se hoje nós devêssemos construir catedrais góticas com os meios de que eles dispunham, nós não conseguiríamos.
“E mesmo que nós conhecêssemos até os pormenores de seus procedimentos, nós não ousaríamos.
“Calcular a resistência de construções como eles souberam realizar exigiria a ajuda de computadores.
“E ainda que nós conseguíssemos, haveria todas as chances de que nós chegássemos à conclusão de que essas catedrais, segundo as normas e coeficientes de segurança que nós aplicamos hoje, não poderiam ficar em pé...”
E, entretanto, elas continuam de pé e continuam nos emocionando, acrescenta Paul F. Paoli, jornalista do “Figaro”.
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