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quarta-feira, 10 de junho de 2015

REIMS: a catedral da sagração dos reis da França

Catedral Notre Dame de Reims, vista interior da nave central
Catedral Notre Dame de Reims,
vista interior da nave central
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs








Toda civilização começa pelos padres, pelas cerimônias religiosas, pelos milagres mesmo. Nunca houve, nunca haverá, não pode haver exceção a esta regra.

Os reis da França conheceram estas leis comuns a todos os povos, quando São Remígio em Reims ordenou a Clóvis, ao sagrá-lo rei dos francos:

“Curva tua cabeça, ó sicambro, adora o que queimaste e queima o que adoraste”.

Entretanto, o poder do Rei da França vem de Deus a um outro título mais especial. Certo dia, Santa Joana d’Arc pediu ao Rei Carlos VII que lhe desse seu reino. Carlos VII ficou embaraçado, mas acedeu.

Santa Joana d’Arc fez lavrar um documento atestando o fato. Depois, em presença dos mesmos tabeliães, e como senhora da França, entregou-a a Deus, Rei do Céu.

E o Rei do Céu e Rei da França, por intermédio da mesma Joana, instituiu Carlos, como também a seus sucessores, seu procurador divino.

Católica, sabedora bastante de que era só no seio da Igreja que ela atingia sua perfeita plenitude, era assim, como procurador de Deus, que a França jubilosa aceitava e gostava de ver o seu rei.

Por isso, nada a empolgava tanto quanto o momento em que ele, na mesma catedral de Reims, ajoelhado diante do grande Pontífice, ouvia estas palavras solenes:

“Eu vos sagro Rei com este Santo Óleo, em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo”.


A cerimônia da sagração de Luís XVI começou com orações às seis horas da manhã do Domingo da Ssma. Trindade de 1775. 

Mas desde as quatro toda a nave estava cheia, e as damas, com trajes de gala, instaladas em seus lugares.

Sagração de São Luís IX.  Charles Amédée Philippe van Loo (1719 – 1795)
Sagração de São Luís IX.
Charles Amédée Philippe van Loo (1719 – 1795)
Erigira-se uma tribuna para que Maria Antonieta e as princesas pudessem ver melhor, sem se misturar com a multidão.

Na nave tinham-se colocado, pela ordem, os príncipes de sangue, os duques, os marechais de França, os pares eclesiásticos, o clero e a magistratura.

Às seis horas e meia, entrada solene dos seis príncipes, coroados e envergando seus mais suntuosos trajes de cerimônia, e representando os três mais antigos ducados e os três mais antigos condados do reino.

São eles: Monsieur, le Comte d’Artois, le Duc de Bourbon, que constituem os seis pares leigos. Os seis pares eclesiásticos trajavam vestes pontificais.

Segundo o cerimonial tradicional, o Rei esperava deitado, vestido com longa túnica de rendas de prata, no leito de Luís XIII, como se estivesse dormindo.

Os dois bispos batem à porta. Do interior, o Duque de Bouillon, camareiro-mor, pergunta:

– A quem procurais?

– Ao Rei – dizem os bispos.

– O rei dorme – replica o camareiro-mor.

– Procuramos Luís XVI, que Deus nos deu para Rei.

Abre-se então a porta, e os dois bispos abençoam o Rei. Em seguida, a entrada solene na catedral.

Enquanto os sinos repicam, o arcebispo e o clero vêm à frente do cortejo real, aberto pelo Condestável de França, representado pelo velho Marechal de Clermont-Tonnerre, portando a espada real, com a ponta para o alto.

Seguem-se cem guardas suíços com oboés, tambores, clarins, flautas e pífaros; os duques – o de Bouillon, o de Duras e o de Liancourt – e nove condes, com suas coroas, longos mantos de arminho e túnicas de ouro.

O futuro rei ficava aguardando ser chamado no Palácio do Tau,  contiguo à Catedral
O futuro rei ficava aguardando ser chamado no Palácio do Tau,
contiguo à Catedral
Depois, entre os dois bispos delegados, o Rei. Por fim os capitães das guardas, com túnicas e mantos de tecido de ouro, e todo o séquito com mantos de cetim branco.

É soberbo o espetáculo desse desfile de trajes de ouro, prata, rendas, veludo e seda, em que dominam o negro, o branco e o roxo, com alguns tons de púrpura e vermelho que realçam o todo.

Sua Majestade senta-se numa poltrona colocada sob o grande dossel erguido no meio do santuário.

O venerável arcebispo de Reims, o Cardeal de la Roche-Aymon, belo com seus mais de oitenta anos, fez questão de oficiar em pessoa, apesar da idade.

Depois do Veni Creator, o prior-mor da abadia de Saint-Rémy se apresenta à entrada da catedral, trazendo a santa âmbula, que tem origem milagrosa.

Foi trazida por uma pomba vinda do Céu, para a sagração de Clóvis. Desde então, ficou sob a guarda do prior de Saint-Rémy. Não deixa a abadia senão para a unção dos reis de França.

O prior-mor a conduz, montando um cavalo ajaezado com seda branca – como a pomba milagrosa – sob um dossel levado pelos quatro barões da santa âmbula: os Srs. de la Rochefoucauld, de Talleyrand, de la Rochechouart e de la Roche-Aymon.

Assim que o arcebispo recebe a santa âmbula e a coloca sobre o altar, o bispo-duque de Laon e o bispo-conde de Beauvais levantam Luís XVI de seu trono, para perguntar aos assistentes se o aceitam como rei.

A resposta a essa pergunta consistia num silêncio respeitoso, que substituía as aclamações de outrora.

O arcebispo se aproxima do rei e pede-lhe segurança e proteção para a Igreja, que o rei promete. Depois os dois bispos apresentam-lhe a fórmula do juramento real, que ele, sentado e de cabeça coberta, pronuncia em latim e em voz alta.

Obriga-se a manter a paz na Igreja de Deus, exterminar as heresias, defender seu povo contra as rapinas e as iniqüidades, governar com justiça e misericórdia, mantendo a ordem no reino, e morrer na Religião.
A Santa Ampoula com o óleo miraculoso com que foram sagrados todos os reis da França desde a conversão de Clóvis
A Santa Ampoula com o óleo miraculoso com que foram sagrados
todos os reis da França desde a conversão de Clóvis

Presta também os juramentos de soberano grão-mestre da Ordem do Espírito Santo e da Ordem de São Luís, e jura observar os editos sobre os duelos.

Levado até o altar e desvestido de sua veste de prata, ao seu lado se prosterna o arcebispo, e os bispos recitam as ladainhas, alternando com o coro. É a humilhação antes da exaltação.

Em seguida o arcebispo, tomando o óleo da santa âmbula, faz-lhe sete unções, dizendo:

“Eu vos sagro Rei, com este Santo Óleo, em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo”.

Sobre o altar se acham preparados a coroa de ouro, pedras preciosas e diamantes, o cetro de ouro de Carlos Magno, o bastão de justiça e o manto real.

São entregues ao rei, com estas palavras:

“Recebei este cetro, símbolo do poder real, cetro de retidão e regra de virtude, para bem conduzirdes a vós próprio, a Igreja e o povo, para vos defenderdes dos maus, corrigirdes os perversos e poderdes passar dum reino temporal a um reino eterno”.

O Rei está sagrado. A cerimônia da coroação vai começar.


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